Disse o Mawlana Sheikh al-Islam Ibrahim Niasse (que Allah esteja satisfeito com ele):

Talvez perguntes: “Onde há alguém que se encaixe em tal descrição? Você falou de uma pessoa mais surpreendente que um pássaro mitológico maravilhoso (anqa)” Mas o conhecimento de onde esses guias podem ser encontrados não é necessário saber. Tudo o que você precisa é sinceridade em buscá-los. Se você for totalmente sincero, certamente descobrirá um guia espiritual. Como Allah disse em dois versículos do Alcorão: “Não é Ele quem responde aos necessitados quando eles clamam a Ele?” (27:62), e, “Porque se eles tivessem sido sinceramente honestos com Deus, seria melhor para eles” (47:21). Portanto, se você precisa urgentemente de alguém que o guie em direção a Allah, tal como uma pessoa sedenta e com extrema necessidade de água ou uma pessoa assustada com extrema necessidade de proteção, você descobrirá que seu objetivo está mais próximo do que ter que pedir. Se você precisa urgentemente de Allah, como a mãe que precisa de seu filho perdido, você encontrará o Real perto de você e pronto para responder a você. Você achará fácil para você a chegada à Presença Divina, e o encontro com o Real será facilitado para você.

O autor, que Allah tenha misericórdia dele, também fala do sheikh como um dos graciosos favores e presentes de Allah ao aspirante. Mas isso é feito desde que o aspirante seja sincero em sua busca e se esforce ao máximo em sua capacidade com o objetivo de seguir o conselho de seu mestre, em vez dos caprichos ilusórios daqueles que não possuem conhecimento. Neste ponto (de sinceridade), Allah o estabelecerá com a conduta apropriada ao lidar com seu sheikh, que então o guiará em direção aos níveis mais elevados e aos mais altos níveis de realização. É o que Seiydi Sheikh Mahi Cisse nos ensina ao dizer: “Se o discípulo é sincero, Allah o guiará (ele ou ela) a um Sheikh.”

De acordo com Sidi Abu Madyan:

O sheikh é alguém a quem tua essência (dhat) reconheceu com preferência e a quem teu ser mais íntimo (sirr) reconheceu com reverência. O Sheikh te refina com seu caráter exemplar, te treina (addaba) inclinando a cabeça em silêncio e ilumina teu ser interior com seu esplendor. O sheikh é aquele que o reúne em sua presença e o preserva em sua ausência.

De acordo com o Lata’if al-Minan:

Seu sheikh não é alguém de quem você ouve; seu sheikh é alguém de quem você recebe. Seu sheikh não é alguém cujas expressões o confrontam; seu sheikh é aquele cujos sinais são secretados dentro de você. Seu sheikh não é aquele que o chama à porta; mas aquele que remove o véu entre ele mesmo e você. Seu sheikh não é aquele cujas palavras o desafiam; ele é aquele cujo estado espiritual o eleva.

Seu sheikh é aquele que o liberta da prisão de seus desejos vãos e o leva à presença do Senhor. Seu sheikh é aquele que nunca cessa de polir o espelho do seu coração, até que as luzes do seu Senhor se manifestem nele. Ele irá encorajá-lo a se dirigir a Allah para que você se encaminhe em direção a Ele, e ele estará com você até que você chegue em Sua Presença. Ele não deixará de estar ao seu lado até que o lance  em Suas mãos e o coloque na luz da Presença Divina. Então ele dirá a você: “Aqui está você e aqui está o seu Senhor.”

(…)

Sempre que o aspirante se depara com alguém que corresponda a essa descrição, é-lhe obrigatório colocar-se à sua disposição, sem qualquer escolha ou vontade pessoal, como um cadáver nas mãos de seu lavador ritual. Ele deve confiar no Sheikh para livrá-lo da angústia em que está imerso e transferi-lo para a serenidade completa e pura; e isso através da contemplação da Presença Divina e nada mais. O discípulo deve se purificar de todas as outras opções ou desejos por qualquer coisa além disso. Sempre que o Sheikh o aconselha ou ordena a fazer algo, ele deve tomar cuidado para não fazer perguntas como: “Por quê?” “Como?” “De que maneira?” “Para qual propósito?” Esta é a causa da repulsa e rejeição do Sheikh. Ele deve estar firmemente convencido de que o Sheikh está mais ciente de seus melhores interesses do que ele, e mais familiarizado com os meios pelos quais eles podem ser alcançados. Ele deve, portanto, acompanhá-lo em tudo, pois o Sheikh só agirá por causa de Allah e com a ajuda de Allah, a fim de retirá-lo das trevas e da luxúria de seu eu inferior.

(…)

Quanto ao sheikh que corresponde a essa descrição, como ele pode ser contatado e como ele pode ser reconhecido? A resposta é que esses shuyukh são muitos, e a maioria deles está nas principais cidades onde estabeleceram residência. Mas quanto a reconhecê-los e contatá-los, este é um problema difícil, obscuro como o enxofre vermelho (kabrit al-ahmar), já que eles se misturaram aos estilos e costumes das pessoas comuns. Se alguém os questionar sobre este estado de coisas, eles irão evitá-lo e expulsá-lo, jurando-lhe que não têm nenhuma ligação com o assunto.

Eles têm uma razão convincente para isso, porque a ordem regular da existência foi perturbada pela Vontade do Real, algo que ninguém pode negar. Agora, a única preocupação de cada indivíduo é a busca de seus interesses egoístas e desejos carnais, em total desconsideração para com a Presença Divina e os deveres e boas maneiras (adab) que deve cumprir. Para o povo comum no tempo presente, a busca dos santos é motivada apenas por seu desejo de alcançar objetivos rebeldes, como o gozo dos prazeres e luxúrias do mundo, proteção contra calamidades e conforto nesta morada. Eles se contentam em deixar de lado seu vício teimoso em causas terrivelmente perigosas de perdição, como cometer pecados maiores abomináveis cuja punição é a danação no fogo do inferno. Nesse estado eles não têm saída de sua prisão e nenhuma maneira de retornar à Presença Divina.

Quando as pessoas conhecedoras de Allah perceberam até que ponto isso se aplicava às pessoas comuns, elas se esconderam delas e se mantiveram longe por todos os meios e em todas as situações. Começaram, então, a viver nos desertos e terrenos abandonados, mas o Real exigiu deles que voltassem a viver entre as pessoas comuns, devido a questões com quais o Real as obrigou por Seu decreto, e ninguém pode contestá-Lo com respeito a Seu decreto. Uma vez que eles não puderam mais encontrar qualquer justificativa para evitar as pessoas comuns – fugindo para as áreas desertas – nem puderam determinar como corrigi-las e trazê-las de volta à Presença Divina, eles se tornaram como alguém que vive em uma sociedade de tolos ignorantes. [Os ignorantes] os acertam com pedras, mas eles são compelidos a suportar com paciência e a viver no meio deles. Sendo esta a armadilha em que se encontraram, os santos se esconderam das pessoas comuns e as mantiveram afastadas o mais possível.

O povo comum às vezes sente o cheiro dos perfumes fragrantes dos santos flutuando por trás dos véus e aparentemente se juntando a eles em suas buscas vãs. Por causa disso, os gnósticos usam vários pretextos para confundi-los. Para manter sua identidade real escondida do povo comum, eles fingiram estar envolvidos em abominações como adultério, fornicação, mentiras obscenas, beber álcool ou suicídio, que condenam seu perpetrador ao desgosto e ira de Allah. Não havia absolutamente nada condenável nessas travessuras dos gnósticos: eles pareciam violar a Lei Sagrada, quando na realidade só estavam se escondendo do povo comum, a fim de ocultar sua posição espiritual e permitir que sua boa conduta fosse livre.

(…)

Se você entendeu isso bem, perceberá que o verdadeiro e os mentirosos estão misturados na arena pública, de modo que o primeiro não pode ser distinguido do último, e é totalmente impossível reconhecer o gnóstico consumado, exceto em casos extremamente raros. No entanto, a possibilidade existe, porque alguns dos gnósticos se manifestaram em formas visíveis que são perfeitamente consistentes com a Lei Sagrada. Suponha que alguém se manifeste de tal forma, reivindicando ser um sheikh com base na força de ser conhecido por guiar as pessoas em direção a Allah, por sua abstinência e falta de interesse neste mundo e seu povo, juntamente com evidências do sucesso alcançado por outras pessoas com sua ajuda. Se for claro para o aspirante que a pessoa em questão corresponde a essa descrição, ele deve comprometer-se com ela no momento do encontro. O que normalmente é exigido do aspirante, no entanto, é que ele deve abster-se de comprometer-se até que tenha estudado a transmissão de relatórios sobre ele de fontes confiáveis e de pessoas intimamente familiarizadas com ele. Então, se ele corresponder claramente à descrição acima, o aspirante deve se comprometer com ele, mas de outra forma não. Aquele que deseja se conectar com um Sheikh na era atual, mas acha difícil reconhecê-lo – com medo de ser enlaçado pelos mentirosos – deve dedicar sua atenção a Allah com absoluta sinceridade.

Ele deve se voltar para Ele com um coração firme e humildemente implorar a Ele para revelar o Sheikh consumado capaz de libertar o discípulo de sua aflição. Ele deve implorar a Allah para guiá-lo em direção a seu sheikh, para capacitá-lo a cumprir seu mandamento e deixá-lo mergulhar nas profundezas do oceano do sheikh. Isso deve ser feito com o conhecimento de que não há nenhum outro meio à sua disposição (para livrá-lo da aflição). Mais importante ainda, aquele que é incapaz de descobrir o sheikh perfeito deve dedicar todos os momentos disponíveis para invocar as bênçãos do Profeta (salāt ‘āla al-Nabī), que Allāh o abençoe e lhe conceda paz. Este é o caminho mais adequado, benéfico, rápido e elevado para atingir o objetivo desejado.

A oração sobre o Profeta deve ser realizada com maneiras perfeitas, presença de espírito e a convicção sincera de que se está sentado à sua frente, e isso deve ser feito com persistência. Se uma pessoa persiste nisso, ansiando por Allah como o homem sedento por água, Allah o pegará pela mão e o puxará para perto. Allah confiará a ele um Sheikh perfeito para guiá-lo pela mão. Ou Allah pode confiá-lo diretamente ao Seu Profeta para ser treinado. Ou Allah pode simplesmente remover seus obstáculos e abrir para ele a porta de chegada. E tudo isso é o resultado da dedicação do servo em invocar bênçãos sobre o Amado de Allāh. Oferecer bênçãos sobre o Profeta é o mais eficaz de todos os meios de acesso a Allah: ninguém que o praticou com constância jamais ficou desapontado na busca por Allah.

(…)

Quanto à questão de escolher o sheikh e julgar suas ações e estados espirituais, isso não é adequado. Quem quer que tenha se engajado nisso jamais alcançou sucesso, pois isso fecha as portas para Allah. Se uma pessoa está inclinada a isso, ela o aplica a todos os seus semelhantes e Allah lhe mostrará deficiência em todas as criaturas, de modo que ela não se sentirá confortável com ninguém. Confiar no Sheikh é uma ordem Divina que Allah colocou nos corações, então o companheiro do Sheikh não pode se separar dele, mesmo que o considere culpado de mil pecados. Se o aspirante for sincero, entretanto, a recompensa por sua sinceridade é que ele não verá nada em seu sheikh, exceto aquilo que acalma seu coração, pois ele não encontrará ninguém além do sheikh verdadeiro. Quanto ao aspirante cujo coração não está limpo, verá apenas o que considera repugnante e inadequado, fazendo-o fugir e alçar-se.

(…)

Você é o irmão do sheikh e ele é o herdeiro. Allah é o libertador e o objetivo é um. Cuidado com a pressa impaciente. Isso (submissão à ordem do sheikh) constitui um desafio difícil, pois marca o fim da vida que você conheceu e o priva de esperanças ilusórias. O Sheikh apenas testa você para atraí-lo para perto. Ele só te aproxima para te tornar humilde. Ele apenas te torna humilde para te sacudir. Ele só te sacode para te plantar. Ele só te planta para te fazer florescer. Ele só te faz desabrochar para dar frutos. Ele só te faz dar frutos para prosperar. Ele só te faz prosperar para que possas se arrepender. Ele apenas faz com que te arrependas para que te tornes seu representante em reter e dar, na dificuldades e no conforto.